sábado, 31 de maio de 2008

VIDA LONGA AOS ROLLING STONES!!

O que dizer das duas horas mais prazerosas dos meus últimos meses? Poder ficar ali, dentro do cinema, e assistir mais uma performance fenomenal da banda minha banda favorita desde sempre, os Rolling Stones?
Ver Keith, Mick, Ronny e Charlie em ação num concerto beneficente no Deacon Theatre de Nova York sob a direção de Scorcese? Logo você, Marty, cineasta dos bons, cuja paixão pela música nos legou obras primorosas como “The last waltz”, onde retratatou a tour de despedida da grande The Band?
O filme se inicia. Assistimos as tratativas entre equipe e banda sobre como as filmagens do concerto transcorreriam. Vemos um diretor e sua equipe minutos antes do show apreensivos diante da incógnita a respeito do set list da noite, preocupados em captar a melhor imagem, o melhor ângulo, porque os Stones se realizam no palco, se consumam no palco, e ele – Marty - sabe disso.
Quando Scorcese entrega os pontos num clima de “seja O que Deus quiser”, eis que surge um assessor da produção entregando o tão aguardado set list.
A banda logo ataca com “Jumping Jack Flash” e Keith entra em ação executando o seu marcante riff que, para mim, é o riff definitivo da história do rock. Um Jagger menino, flutuando pelo palco com seus trejeitos característicos. Jovial aos 65 anos de idade. Na platéia, pelo menos umas 3 ou 4 gerações se confraternizam em meio a anônimos e celebridades como o casal Clinton, uma amostra da sua longevidade e carisma ao longo de mais de 4 décadas de rock'n roll.
Em seguida mais petardos, músicas há muito não executadas, outras surpresas como “She was hot”, e um casting dos convidados, que reuniu Jack White, Cristina Aguilera (!!) e o mestre Buddy Guy.
Primeiro Jack White, cujo sorriso não esconde a enorme satisfação de estar tocando no palco com aquelas lendas. Ataca de “Loving Cup”, faixa de Exile on Main Street, de 1972, e que fora por diversas vezes tocada pelos White Stripes em suas apresentações ao vivo.
A banda de apoio, sem comentários: de Bobby Keys aos backing vocals Bernard Fowler e Lisa Fischer, todos em excelente forma e numa noite pra lá de feliz.
Buddy Guy destruindo sua guitarra em uma Jam arrasadora com Ronny e Keith. Cristina Aguilera, quem diria, moçoila que bem poderia ser neta desses senhores, dá um banho de profissionalismo e garra em “Live with me” e ao final Jagger solta essa: “I loved it”! Nós gostamos, Mick. No mínimo achamos curioso. Aliás, você continua afiado nas suas apostas, vendo sempre o que é melhor para a sua banda e acertando na maioria delas.
E Mestre Keith, do que mais é capaz esse homem?
O bardo e sua guitarra. Não importa se diante de uma pessoa ou de um milhão delas: a deferência ao seu instrumento é sincera e comovente. Sempre. Afinal, nele reside toda a sua razão de existir, sua vida. O momento mais emocionante do documentário é a entrevista com Keith, onde o repórter pergunta: “Quando você está no palco, no que você pensa? Você se concentra na guitarra ou na platéia?”, ao que Keith responde: “No palco não tem como você interpretar. No palco você é o que é. Pelo menos para mim é assim. E isso só é possível porque amo muito o que eu faço”.
Esse amor é visível por todos Keith e como fãs, só temos a agradecer as noites que passamos em claro, algumas bebendo e jogando conversa fora por aí, vibrando ao som dos seus riffs. Muito bacana ouvir de Ron Wood, seu amigo e comparsa de cordas e “otras cositas más”, dizer: “tocar com Keith é demais. Embora não pareça, ele é um dos sujeitos mais éticos e atenciosos que conheço”.
O repórter, então, pergunta a Keith: “Quem é melhor guitarrista: você ou Ron?”
E Keith sentencia: “sozinhos não somos grande coisa, mas juntos valemos por 10 guitarristas”. E, falem o que quiser, pode tratar-se de um conjunto ou mesmo uma corporação (para muitos uma instituição), mas se Jagger é o cérebro da banda, Keith é a sua alma.
Ao sair da sala com a energia revigorada, paro pra pensar que os meus problemas nem são tão grandes assim. Afinal, ver a disposição e entrega daqueles senhores que há mais de 40 anos estão na estrada e viveram tantas experiências, inúmeras vezes desacreditados, vivendo no limite e além da linha que transpõe qualquer ato mínimo de racionalidade, vendo-os ali, felizes, com os anos e percalços da vida marcados em seus rostos, enormes sulcos, me envergonho da minha pequenez.
Muito obrigada, Stones, por mais uma vez darem um sentido à minha vida. E mais uma vez volto aos meus 07 anos de idade, em casa, colocando o volume da vitrola no máximo para escutar o riff de “Satisfaction” pela 1ª. vez, num misto de curiosidade e excitação: uma experiência indescritível!
Hoje chego em casa e procuro o tal disco. Ele está lá, resistindo ao tempo. Procuro pela mesma faixa e, saudosa, recordo das conversas com a garotada da rua, do Júlio e do Passarinho, os nossos Jagger e Richards, quando o Márcio, irmão do pássaro, comprou uma telecaster e a garotada toda foi até a porta da casa deles pra ver a guitarra “igualzinha a do Keith Richards!”, garotada que realizava verdadeiras ações em conjunto – isso sim, uma verdadeira benemerência – de gravar fitas K7 para compartilhar com os amigos o deleite que era ouvir cada disco dos Stones e de tantas outras bandas legais que a gente curtia e curte até hoje.
Eu sei, alguns discos nem tão brilhantes ali, alguns riffs marcantes aqui, mas a essência, essa continua firme e forte – e não há como não admitir o fascínio incansável que esses senhores ainda exercem sobre milhares de pessoas - fato comprovadíssimo após o prazer de assisti-los ao vivo em 1995 (uma das maiores emoções e satisfações da minha vida) e hoje ao final de 122 minutos de puro deleite. O sentimento era o mesmo, o de reverência e agradecimento a essa que é a maior banda da história do rock’n roll, falem o que quiserem, aconteça o que acontecer. Porque tudo se resume a antes e depois dos Rolling Stones. O resto é imitação barata, no mínimo esforçada.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Por ninguém e para ninguém.




















09.02.2008

Esses dias eu estava lembrando que no ano passado ( 2007 ), completou-se 40 anos do lançamento do Sgt. Pepper Lonely Hearts Club Band, álbum esse que até hoje é considerado o maior feito pelos Beatles em toda sua carreira. É claro que não deixa de ser louvável esse fato, ainda mais por que grande parte da imprensa musical de relevância opinou nessa direção, mas o mais curioso nisso tudo, é que em 2006, não se comemorou 40 anos do grande Revolver, mas porque?

Talvez seja pelo fato de não ter-se tido tempo suficiente para aprecia-lo, pois era comum na época lançar um álbum a cada ano, e não a cada dois ou três como hoje, pois se ganha muito com as turnês, além de que os artistas atuais não possuem tanto talento assim para lançar grandes álbuns todos os anos. O caso mais expressivo que me ocorre agora é o Radiohead, que emplacou dois colossos musicais em seqüência, claro que não no ano seguinte ao primeiro lançamento, The Bends em 1995 e OK Computer em 1997. Então, em uma época tão fértil, tão cheia de grandes artistas e grande obras, Revolver ficou quase que ofuscado com o intenso brilho de Sgt. Pepper. Porém, não há como não se empolgar ao ouvir Revolver de faixa a faixa, pois consegue ser ao mesmo tempo inovador e conservador, moderno e antigo, agradando a todos os tipos de público, ora com sutileza de Here, There, and Everywhere, com a alegria de And Your Bird Can Sing, ou o hipismo de Yellow Submarine e She Said She Said, além das várias versões feitas por artistas de diversos gêneros. É só conferir na trilha sonora do filme “Uma Lição de Amor”( I Am Sam ) com Sean Penn e Michelle Pfeiffer, a faixa número nove I´m Only Sleeping interpretada pelo discutível The Vines, e que está ótima, um pouco mais rápida que a original, mas grandiosa e fresca como se fosse bem atual, e é nisso que os Beatles se saem melhor, é nessa vivacidade.

Também nessa linha ouvi lindamente interpretada, a canção que considero a melhor de Revolver, For No One, primeiro na voz de Caetano Veloso em 1975 no álbum Qualquer Coisa, revestida numa roupagem bossa novística, a música se revigora numa caetanidade, com direito a inicio assoviado e violão marcado, Caetano imprime seu inconfundível sotaque carregado a um inglês quadrado que ficou ótimo, e depois uma versão terminal feito pelo grande Elliott Smith, toda sussurrada do começo ao fim, Smith coloca uma emoção tão grande na canção, que chega a dar a impressão de que essa seria a última música que cantaria na vida. Mas nada é igual ao original, é como um quadro, por mais que a réplica sirva muito bem em nossa sala, nada se compara a ter um original, e nesse caso também, pois é lindo aquele começo com Paul ao piano e Ringo marcando de leve na bateria, a voz do mesmo Paul com uma firmeza e uma seriedade talvez não antes vista, anuncia os primeiros versos que conduziram a música até o derradeiro refrão. Nota-se um flerte do piano numa escala Mozartiana, algo realmente clássico, e numa música pop, para vermos o nível em que estavam o quarteto de Liverpool, porém o ponto mais lindo da música é o solo de trompa lá por volta dos 51 segundos, mágico, angelical. A letra fala de abandono e saturação em uma relação, uma situação de extrema dependência de alguém para com o outro, ao ponto de não aceitar a separação e buscar em falsas evidências aquilo que você gostaria que fosse. Isso fica claro na letra quando ele diz: “ No entanto você já não acredita nela quando ela diz que seu amor já morreu…”, esse pensamento é claramente uma forma de amenizar a própria dor, pois você acredita piamente no que diz o refrão: “Um amor que deveria ter durado anos”, mas que agora você não aceita que acabou. O dia começa e seu mundo começa também a ruir, pois “você descobre que todas as coisas gentis que ela disse, não fazem mais sentido”, pois sua companheira acorda e sem pressa se maquia, toma lentamente seu café prenunciando sua saída, demonstrando uma indiferença inexplicável, pois como alguém que dividirá com você todas as coisas, até as mais intimas por tanto tempo, hoje o vê como um estranho. E o mais triste dessa história, é que o amor é tão sublime, que chega a admitir que “haverá um dia em que todas as coisas que ela disse, encherão sua cabeça, mas você não conseguirá esquecê-la”, e mesmo depois de quase rastejar-se pelo chão numa súplica desesperada, ela nada expressa, “e nos olhos dela você não vê nada, nenhum sinal de amor atrás das lágrimas choradas por niguém”( for no one ).



















*Obs. Letra traduzida consultada do site Vaga-lume.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

A Arquitetura da Angústia.





















São Paulo, 07.01.2008

Estou sozinho no meu quarto, observando a noite negra de uma brisa levemente fria, no som toca Portishead. É inevitável a sensação “deprê” que toma conta de qualquer ambiente que se toque essa banda, pois além de uma perfeição narcísea, é impossível não se arrepiar ao ouvir a canção “Humming” com seu inicio fantasmagórico. Se o Portishead tivesse sido criado nos anos 20, com certeza F.W.Murnau usaria como trilha sonora de seus filmes se esse recurso estivesse a época disponível, pois não há como não comparar com a famosa cena da projeção da sombra de Nosferatu com suas garras afiadas, e com o medo primitivo que o expressionismo alemão nos dá. Já “All mine” é uma sinfonia quase fúnebre, com batidas secas e cortantes, um clipe “PB” climático e uma menina assustadoramente inexpressiva, quase morta no vocal, acompanhada por uma banda de velhos vestidos em trajes de gala para um concerto cemiterial. Com o transcorrer da canção e o bradar dos versos, chega-se ao refrão clamoroso que é o título da música, nessa hora um efeito cria um vulto crescente da menina a deformando, dando-a uma aparência medonhamente cadavérica. Outra experiência sombria é ficar em silêncio absoluto no escuro ouvindo a faixa “Over”, é como vagar a meia-noite pelo cemitério da consolação e perder-se entre seus labirintos. Medo e paranóia, depressão e vertigem são sensações causadas pelas músicas desse álbum*, que invadem nosso inconsciente despertando fantasmas internos que há muito estavam mofando em nossa mente. O solo torto de guitarra aos 3 minutos e 28 segundos sobe a espinha como um calafrio, com um sopro na nuca inesperado no meio da noite. Mas há também beleza no Portishead, principalmente na singeleza da gélida “Mourning air”, que começa com um sussurro e uma pequena e fina seqüência de dissonâncias de baixo tom de guitarra, porém aos 0:35 segundos ouvisse um metal, aquele que tudo salva, uma clarineta ou espécie de trombeta do juízo final preludiando a canção. Esse clarin da inicio a um acid jazz denso, climático, marcado por uma linha de baixo soturna e um vocal levemente desesperado de uma Beth Gibbons inspirada. A tradução livre dessa canção chega a um “Ar fúnebre”, e fala sobre fraqueza e dependência em relação a hesitação em se dar uma nova chance a uma possível traição. É um belo tratado de angustia e beleza mórbida, não se assemelha em sonoridade, mas em termos de profundidade é possível ver um “quê” de The Cure no Portishead, é ouvir pra crer.













* O álbum mencionado é “Portishead”, homônimo de 1997.